É preciso matar O psicólogo
Na graduação é natural que se perceba reverberações de idealizações e fantasias de como é ser um psicólogo. Com seus feitos soberanos e eloquência admirável. Aquele “mestre” que quando abre a boca causa um estrondo. Um grande “trovão do insight”. O que é humilde, mas que ao mesmo tempo não pode falhar. O cientifico que tem que ser sensível a fala dessa pessoa que chega. O psicólogo quase não pisa no chão, uma névoa de sua abordagem o carrega de um lado para o outro. Freud disse que é assim, Perls que é assado, tenho que ser espontâneo como Moreno! Um retrato interessante e bem intenso do que vivi na graduação, claro que observei isso em outros alunos, mas esse texto não é um ataque a um-outro-qualquer, mas é um texto que se pretende dobrar sobre si mesmo e funcionar como um espelho. “Eis tu!”.
Essas idealizações são repletas de potência, elas movem os corpos, fazem conflitos teóricos acontecerem, o que até certo ponto é saudável. Mas pode acontecer de começarmos a esquecer o porquê de estarmos nesse conflito. Como Gabriel García Márquez em seu livro “Cem anos de solidão”. Quando as pessoas começam a esquecer o nome dos objetos, depois disso esquecem suas funções. Talvez seja necessário sempre dar esse passo para trás. Estamos sempre nos esquecendo, sempre nos movimentando entre nossa vida e a dos outros. Nesse meio local, no entre-vidas algo acontece. É nesse momento que podemos nos lembrar para quê estamos ali diante da outra pessoa. Agradar os autores? Quem conseguir suportar o peso dos totens que o faça. A graduação vem deixando suas pistas, seus resquícios e isso faz parte do aprendizado. Uma mudança de perspectiva. É necessário que mate, simbolicamente, este modo de ser psicólogo. É necessário que nasça, que recrie que faça surgir um novo modo. Um que consiga lidar com os parâmetros constitutivos da realidade. Quebrar o espelho, bifurcando o caminho, deixar se perder. E então. responder a grande pergunta: O que realmente importa?
Acredito que olhar a Psicologia atualmente, em grande medida, como trabalho, seja uma dessas maçãs que podem ser comidas. Algumas pessoas comem antes, depois ou nem chegam a comer. Ser expulso do paraíso de um desses idealismos e ser jogado no inferno do real é o que há de mais necessário. É a justa medida. Outras virão. Esse texto é um desabafo, ele necessitou ser escrito.
Agora o deserto precisa ser povoado.